ZARC e chuva: planejamento para o plantio de soja
Qual a relação entre o ZARC e a chuva e como esses dois fatores impactam no planejamento do plantio de soja no Brasil?
A janela principal para o início do plantio de soja da maioria das lavouras no país geralmente se concentra entre setembro e outubro.
Contudo, essa data não é arbitrária. Ela é determinada pela convergência da lei e do clima: dois instrumentos do planejamento agrícola.
ZARC e o Vazio Sanitário: as datas que não podem ser ignoradas
Referente à lei, primeiramente, a janela de plantio só se abre após o término do Vazio Sanitário.
Trata-se de uma medida fitossanitária obrigatória que controla a incidência da ferrugem asiática.
Seu principal objetivo é quebrar o ciclo de vida do fungo, eliminando todas as plantas hospedeiras por um período de geralmente 90 dias.
Embora as datas exatas de início e fim variem de acordo com a legislação de cada estado, esse rigor na eliminação de restos culturais e plantas voluntárias (guaxas) é essencial para reduzir a fonte de infecção.
Dessa forma, garante que a próxima safra comece com a menor pressão de pragas e doenças possível, alinhando-se com as janelas seguras definidas pelo ZARC.
ZARC: impacto da ciência na estabilidade da produção de soja
Em seguida, as datas são balizadas pelo Zoneamento Agrícola de Risco Climático – criado a partir de pesquisas da Embrapa e operacionalizado pelo Ministério da Agricultura.
Em suma, o ZARC é um modelo agrometeorológico construído sobre dados climáticos históricos de décadas.
Define os períodos de menor risco climático para a cultura em um município específico.
Sua alta precisão de dados resulta de uma análise detalhada que considera três fatores essenciais:
- Tipo de solo: características de retenção de água;
- Ciclo da cultivar: o tempo que a variedade de semente (rápida, média ou tardia) leva para se desenvolver;
- Dados climáticos históricos: padrões de chuva, temperatura e radiação solar na localidade.
A precisão do ZARC se aprofunda por microrregião e até mesmo dentro da fazenda.
Em um anúncio, o Mapa divulgou a próxima etapa do projeto-piloto do Zarc Níveis de Manejo (ZarcNM), inicialmente focado na soja do Paraná.
O ZarcNM ainda é um teste, mas sua relevância é altíssima, pois avança para o detalhamento por talhão, considerando o manejo sustentável adotado pelo produtor.
Esse novo nível de precisão visa incentivar práticas eficientes e diferenciar o risco para fins de seguro agrícola e contratos de financiamento.
Para o produtor que adota o melhor manejo, pode resultar em subsídios maiores.
Alta adesão ao ZARC
O produtor que busca alta produtividade da sua lavoura, consulta a portaria do ZARC específica para a safra e para o seu município.
Mesmo não sendo uma obrigação legal direta plantar no período definido pelo Zoneamento, a adesão dos produtores é altíssima.
Primeiro porque funciona como uma fonte de informação relevante.
E segundo, porque obedecer a janela do ZARC também é exigência no momento de contratação do seguro agrícola e no financiamento da produção.
No acesso ao crédito rural, a maior parte dos financiamentos oferecido por bancos e cooperativas exige que o plantio seja realizado dentro das datas estabelecidas.
Caso contrário, o seguro agrícola não será válido.
Se o produtor plantar fora do período sugerido e tiver uma perda de produção devido a um evento climático, ele perde o direito de acionar o seguro.
Também, perde o direito ao programa de garantia da atividade, como o Seguro Agrícola (PROAGRO).
Sendo assim, seguir o calendário aumenta a probabilidade de uma boa safra, o objetivo principal de qualquer produtor.
Atraso da chuva: o dilema de plantar “no pó” sem perder a janela do ZARC
Uma vez que o Vazio Sanitário se encerra e a janela do ZARC se abre, a decisão de plantar deve considerar o clima.
O primeiro dilema que vamos discutir aqui é: a janela do plantio está aberta, o seguro depende disso, mas o solo está seco.
O que fazer? Uma primeira opção é esperar a chuva ideal, entre 20 e 30 mm, que vai garantir a germinação, acompanhando os relatórios meteorológicos.
Outra opção pode ser escolher semear ‘no pó’, ou seja, no solo ainda sem umidade suficiente.
Pesquisas apontam que a semeadura em solo com insuficiência hídrica prejudica o processo de germinação, podendo torná-lo mais lento.
Expõe as sementes às pragas e aos microorganismos do solo, reduzindo a chance de obtenção da população de plantas desejada, em número e uniformidade.
Se a chuva não chegar com o volume necessário para sustentar a emergência, a plântula pode secar e morrer antes de emergir.
Paradoxalmente, um evento de chuva muito forte e isolado pode ser prejudicial.
Se chover forte logo após o plantio no pó, a formação de uma crosta na superfície do solo pode impedir que os brotos consigam emergir.
Contudo, mesmo não sendo a melhor solução, é uma técnica para não perder a janela do ZARC, não deixando o investimento totalmente desprotegido.
Além disso, atrasar o plantio principal empurra a colheita para frente, o que pode inviabilizar a semeadura de uma segunda safra.
Excesso de chuvas: estratégias para semear no limite da janela
O segundo dilema é o oposto: a chuva é muita, não para de cair, impede a entrada de máquinas e o solo fica encharcado.
Se atrasar o plantio, o produtor pode perder a data limite do ZARC e novamente, aparece a problemática sobre a inviabilidade da safrinha.
Quais as possibilidades neste caso?
A primeira solução é garantir que o solo tenha boa infiltração e que as máquinas consigam trabalhar nas pequenas janelas de estiagem.
Veja nosso post sobre o preparo do solo em clima instável:
Para tal, existem duas frentes de atuação: o escoamento superficial, feito por meio de estruturas como terraços para conduzir a água de forma controlada e evitar a erosão; e a drenagem interna, melhorada pela adoção do plantio direto e pela manutenção da matéria orgânica no solo.
Ao tornar o solo mais poroso, aumenta a velocidade de infiltração da água, reduzindo o tempo para o solo voltar à condição ideal de plantio.
A segunda solução é apostar em cultivares de ciclo precoce, que completam seu desenvolvimento em menos tempo.
Esta decisão técnica permite que a colheita da soja ocorra mais cedo.
Além disso, retoma parte do tempo perdido e viabiliza o plantio da safrinha dentro de uma janela mais segura.
Planejamento detalhado e liderança global
Resumidamente, a gestão para equilibrar o ZARC com as imprevisibilidades da chuva é o que sustenta a alta produtividade e a resiliência da sojicultura brasileira.
É justamente esse nível de planejamento científico e técnico, que vai do mapeamento de risco por município até o avanço da análise por talhão, que permite ao Brasil manter sua posição como líder na produção de grãos de soja do mundo.
Ao mitigar perdas e garantir a viabilidade da dupla safra, o produtor brasileiro transforma o domínio técnico em produtividade e segurança alimentar global.
